12 de julho de 2014

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Na torre era mais fácil. Uma escada de ferro nos ligava ao restante do mundo. Havia relógios de vários tamanhos e janelas falsas. A película sobre o vidro envolvia tudo e todos em um crepúsculo permanente, e a sala daquela maneira, coberta dia e noite pela penumbra, me trazia lembranças do carvão. Tudo tragado pelo alarme do computador. Depois daquele dia, foram outros nove no chão na sala com a televisão ligada. Se aparecia a fotografia da torre, desviava o olhar. Não comi. De vez em quando o telefone tocava: alguém com sotaque estrangeiro me pedia para olhar pela janela. Não olhei. Tranquei as portas e coloquei panos nas frestas. Quando fechava os olhos, surgiam vagos contornos geométricos, figuras rudimentares. Senti que precisava de superfícies macias onde me apoiar. Forrei o chão com cobertores, cortei almofadas e tirei a espuma. O sofá manchado de tinta azul. Recortei a mancha e colei o retalho no vidro. O telefone tocou de novo: Magda, Magda, olhe pela janela. Não olhei. A luz da casa ao lado sempre acesa. Eu procurando o escuro e a luz lá. Tentei atirar alguns caroços de frutas, que caíam na minha frente antes de alcançar a grade. Na rua, alguém mencionava um molho de chaves perdido, o eco chegando aos meus ouvidos e me lembrando das gárgulas. Duras. De pedra. O concreto da pista. Sem olhos, sem pele. A mesa, os computadores, os telefones e o emaranhado de fios. Não pensei em nada disso ao longo dos nove dias. Mas foi nesse período que passei a ouvir melhor, a ouvir coisas que não ouvia antes. Da parede saía um barulho contínuo de água. Para onde corria a água, a quem se destinava a água. Algo despencou da janela do andar de cima, não lembro se um gato ou pedaços de pão. No táxi a caminho do hospital ouvimos uma música. Havia túneis e todos nós erramos o caminho. Ainda estou deitada sobre os cobertores e sobre a espuma esfacelada. Não posso ir ao hospital. Nunca peguei um táxi para ir ao hospital. Foi o gato que despencou da janela do andar de cima, tenho certeza. Meu olho direito começa a inflamar. Magda, Magda. Pela janela. O alarme dispara.

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