7 de setembro de 2014
correção de deriva ou os efeitos do vento
No chão da sala. Os espelhos estão cobertos com papel pardo. A luz que incide aqui dentro é fraca e sem cor, estancada pelo papelão que reveste a janela. Assim que soube da torre, das ameaças e do número de mortos, passei a tomar providências. Distribuí os utensílios da cozinha em pequenos pacotes, as facas e descascadores, o abridor de latas, a tesoura. Enrolei fita isolante nos dedos das mãos e dos pés, mais sujeitos ao choque. Removi uma a uma as fotografias dos álbuns tomados pelo mofo e as organizei em pilhas / você para e observa a menor delas, antes de notar a mancha amarela sobre o papel. A mancha amarela é o casaco que ganhei de presente. Estou sozinha há quarenta e três dias. Continuo a imprimir teoremas matemáticos e a fazer anotações importantes na parede. Aqui e ali, me detenho nos pontos onde a tinta descascou. Você observa tudo de um ponto mais alto, como se buscasse uma visão geral da cena. Estou sozinha desde que saímos do salão. Da torre. Da festa suspeita em que deixei para trás o casaco amarelo. Você chega mais tarde e observa o cabide na entrada, depois desaparece. Continuo sozinha há quarenta e três dias. A água ainda escorre dentro da parede, mesmo com o registro fechado. O telefone fica fora do gancho. Você toca a campainha e estica a mão. Eu deito e durmo e no sono recupero a imagem das suas unhas recém-cortadas. Você não usa anéis, nem toca piano.
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